Recordação do 1.º Congresso

Astrojildo Pereira

23 de março de 1946


Primeira edição: A Classe Operária, nº 3 da terceira fase, 23 de março de 1946, pp. 4.

Fonte: Arquivo Marxista na Internet, Seção Temática, Imprensa Proletária: A Classe Operária.

Transcrição e HTML: João Victor Bastos Batalha.

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O Congresso de fundação do Partido Comunista do Brasil reuniu-se nos dias 25, 26 e 27 de março de 1922, realizando 5 sessões — a primeira no dia 25, duas no dia 26 e as duas finais no dia 27. As reuniões se faziam em lugares diferentes, umas no Rio, outras em Niterói, à rua Visconde do Rio Branco n.º 651. Recordo-me perfeitamente que, ao encerrar-se o Congresso, os delegados presentes, fundadores do Partido Comunista do Brasil, cantaram, em surdina e de pé, as estrofes da Internacional.

Os delegados eram em número de 9, representando os grupos comunistas do Rio, Niterói, Porto Alegre, São Paulo, Cruzeiro, Santos, Juiz de Fora e Recife. A ordem do dia constava de 5 pontos: 1.º) Exame das 21 condições de admissão na Internacional Comunista; 2.º) Estatutos do Partido Comunista do Brasil; 3.º) Eleição da Comissão Central Executiva; 4.º) Ação pró-flagelados do Volga; 5.º) Assuntos vários.

Somente em junho seguinte foi publicada, pelo “Movimento Comunista”, a notícia e as resoluções do Congresso, inclusive os Estatutos do Partido, já devidamente legalizados.

Dizia-se aí, em artigo assinado pelo redator da revista, que “era o Brasil talvez o único dos países de uma certa importância mundial onde não havia ainda um partido comunista regularmente organizado”. Explicava-se o “legítimo e grave contentamento” com que era lançada a público a notícia da constituição definitiva do Partido. Mostrava-se qual a tarefa histórica do Partido: “formar, num só corpo orgânico, sólido e homogêneo, a vanguarda do proletariado internacional”, para o fim de “organizar e orientar as grandes massas trabalhadoras do Brasil em suas lutas e movimentos de reivindicação”. Definia-se, enfim, o seu caráter de partido independente da classe operária: “Partido genuinamente proletário, constituído pela camada mais consciente e mais combativa do proletariado, o Partido Comunista, por sua mesma natureza, destina-se a ser o intérprete fiel e o guia experimentado dos trabalhadores em suas lutas pela própria emancipação”.

A Comissão Central do Partido instalou-se numa pequena sala do sobrado ainda hoje existente na rua da Constituição, esquina da Praça da República, e aí funcionou, legalmente, até os primeiros dias de julho. No dia 5 de julho de 1922, deflagrava o levante do forte de Copacabana, e, no mesmo dia, começava o estado de sítio que, de prorrogação em prorrogação, duraria até 31 de dezembro de 1923, para recomeçar com o segundo 5 de julho, em 1924. Resultado para o Partido: sede invadida e fechada pela polícia, prisão dos comunistas, mergulho na ilegalidade.

Não quero fazer comparações; mas não deixa de ser curiosa a coincidência de também terem sido em número de 9 os delegados presentes ao primeiro Congresso do Partido Operário Social-Democrata da Rússia, reunido muitos anos antes, em 1898, mas igualmente no mês de março. Segundo se lê na “História do Partido Comunista (bolchevique) da URSS”, o primeiro Congresso do Partido russo foi apenas um “ato formal”, mas um ato formal “que desempenhou um grande papel no conjunto da propaganda revolucionária”. Coisa semelhante se poderá dizer do primeiro Congresso do Partido brasileiro: foi um ato modesto, em si mesmo, de reduzida importância; mas foi o marco inicial de uma longa, atribulada e gloriosa história.