Salário, Preço e Lucro

Karl Marx


4. Oferta e Procura


Nosso amigo Weston faz seu o provérbio latino repetitio est mater studiorum, que significa: “a repetição é a mãe do estudo”, razão pela qual nos repete o seu dogma inicial sob a nova forma de que a redução dos meios de pagamento, resultante de um aumento dos salários, determinaria uma diminuição do capital, etc. Depois de haver tratado de sua fantasiosa teoria da moeda, considero de todo inútil deter-me a examinar as conseqüências imaginárias que ele crê necessário deduzir de sua imaginária catástrofe dos meios de pagamento. Passo, pois, imediatamente, a reduzir à forma teórica mais simples o seu dogma, que é sempre um e o mesmo, embora repetido sob tantas formas diversas.

Urna única observação evidenciará a ausência de sentido crítico com que ele trata o tema. Declara-se contrário ao aumento de salários, ou aos salários altos, obtidos em conseqüência deste aumento. Pois bem, pergunto eu: o que são salários altos e o que são salários baixos? Por que, por exemplo, 5 xelins semanais são considerados como um salário baixo e 20 por semana são reputados um salário alto? Se um salário de 5 é baixo, em comparação com um de 20, o de 20 será todavia mais baixo comparado com um de 200. Se alguém fizesse uma conferência sobre o termômetro e se pusesse a declamar sobre graus altos e graus baixos, nada nos ensinaria. A primeira coisa que teria de explicar é como se encontra o ponto de congelamento e o ponto de ebulição, e como estes dois pontos-padrão obedecem às leis naturais e não à fantasia dos vendedores ou dos fabricantes de termômetros. Ora, pelo que se refere a salários e lucros, o cidadão Weston não só se esqueceu de deduzir das leis econômicas esses pontos-padrão, mas também não sentiu sequer a necessidade de indagá-los. Contenta-se em admitir as expressões vulgares e correntes de alto e baixo, como se estes termos tivessem algum significado fixo, apesar de que salta à vista que os salários só podem ser qualificados de altos ou baixos quando comparados a alguma norma que nos permita medir a sua grandeza.

O cidadão Weston não poderá dizer-me por que se paga uma determinada soma de dinheiro por uma determinada quantidade de trabalho. Se me contestasse que isto corre por conta da lei da oferta e da procura, eu lhe pediria antes de mais nada que me dissesse qual a lei que, por sua vez, regula a da oferta e da procura. E esta réplica pô-lo-la imediatamente fora de combate. As relações entre a oferta e a procura de trabalho acham-se sujeitas a constantes modificações e com elas flutuam os preços do trabalho no mercado. Se a procura excede a oferta, sobem os salários; se a oferta supera a procura, os salários baixam, ainda que em certas circunstâncias possa ser necessário comprovar o verdadeiro estado da procura e da oferta por uma greve, por exemplo, ou outro procedimento qualquer. Mas se tomardes a oferta e a procura como lei reguladora dos salários, seria tão pueril quanto inútil clamar contra uma elevação de salários, visto que, de acordo com a lei suprema que invocais, as altas periódicas dos salários são tão necessárias e tão legítimas como as suas baixas periódicas. E se não considerais a oferta e a procura como lei reguladora dos salários, então repito minha pergunta: por que se dá uma determinada soma de dinheiro por uma determinada quantidade de trabalho?

Mas para focalizar as coisas com maior amplidão: equivocar-vos-ei por inteiro, caso acrediteis que o valor do trabalho ou de qualquer outra mercadoria se determina, em última análise, pelo jogo da procura e da oferta. A oferta e a procura só regulam as oscilações temporárias dos preços no mercado. Explicam porque o preço de um artigo no mercado se eleva acima ou desce abaixo do seu valor, mas não explicam jamais esse valor em si mesmo. Vamos supor que a oferta e a procura se equilibrem ou, como dizem os economistas, se cubram mutuamente. No preciso instante em que estas duas forças contrárias se nivelam, elas se paralisam mutuamente, deixam de atuar num ou noutro sentido. No mesmo instante em que a oferta e a procura se equilibram e deixam, portanto, de atuar, o preço de uma mercadoria no mercado coincide com o seu valor real, com o preço normal em torno do qual oscilam seus preços no mercado. Por conseguinte, se queremos investigar o caráter deste valor, não nos devemos preocupar com os efeitos transitórios que a oferta e a procura exercem sobre os preços do mercado. E outro tanto caberia dizer dos salários e dos preços de todas as demais mercadorias.