Constatamos, até aqui, a imensa envergadura, a profundidade estratégica e a impressionante multiplicidade das tarefas desempenhadas por Stálin no curso do primeiro ciclo revolucionário, tanto no período de refluxo reacionário quanto durante o renascimento da atividade revolucionária que se seguiu à primeira insurreição armada. Contudo, ainda mais decisivo e historicamente relevante foi o papel desempenhado por Stálin durante a etapa da ditadura do proletariado, quando se impôs, como tarefa imediata e inadiável, não apenas a defesa intransigente do poder soviético recém-conquistado, mas também a edificação de um sistema econômico socialista enraizado na nova base material de produção e, simultaneamente, a construção de uma sociedade socialista, tudo isso sob as condições adversas de um cerco implacável imposto pelo imperialismo internacional.
Ao definir o significado histórico-universal da Revolução de Outubro, em seu artigo “A Revolução de Outubro e a Questão Nacional”, publicado no Pravda nos dias 6 e 19 de novembro de 1918, Stálin afirmou:
A grande significação internacional da Revolução de Outubro consiste, sobretudo, no seguinte:
1. Ela ampliou os marcos da questão nacional, deixando de abordá-la como uma simples luta contra formas específicas de opressão nacional, para elevá-la ao patamar da luta geral dos povos oprimidos — das colônias e semicolônias — contra o jugo do imperialismo;
2. Ela desvelou novas e vastíssimas possibilidades de emancipação nacional e revelou o caminho autêntico da libertação, contribuindo de forma decisiva para a causa da libertação dos povos oprimidos, tanto do Ocidente como do Oriente, unindo-os no terreno comum da luta revolucionária contra o imperialismo;
3. Ela lançou uma ponte histórica entre o Ocidente proletário-socialista e o Oriente colonial-escravizado, traçando uma nova linha de revoluções antimperialistas que se estende do proletariado do Ocidente, atravessa a revolução russa e chega às nações oprimidas do Oriente.
Isto, de fato, explica o entusiasmo profundo e inapagável demonstrado pelo proletariado russo pelos trabalhadores oprimidos do Oriente e do Ocidente.
E isto também explica, em larga medida, a fúria cega e assassina com que os bandos imperialistas do mundo inteiro se lançaram sobre a jovem República Soviética.
De fato, a Grande Revolução Socialista de Outubro de 1917 desencadeou uma tempestade de ódio e violência por parte do mundo capitalista, que se uniu numa cruzada contrarrevolucionária para esmagar o poder dos sovietes, atacando com brutalidade a nascente União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS).
Tanto Lênin quanto Stálin, assim como todo o Partido Bolchevique, compreenderam, com plena nitidez e visão estratégica, que a burguesia derrotada jamais aceitaria pacificamente a perda de seu domínio, e que lançaria mão de todos os meios — sobretudo da força militar — para tentar restaurar sua ditadura de classe. Por conseguinte, tornou-se cristalino para os dirigentes revolucionários que, para preservar a jovem República dos Sovietes, repelir os ataques internos e externos da reação burguesa e esmagar toda tentativa de restauração capitalista, era absolutamente imperativo fundar uma poderosa organização armada de novo tipo: o Exército Vermelho.
Desde os primeiros dias da Revolução de Outubro, responsabilidades imensas e pesadíssimas recaíram sobre os ombros de Lênin e Stálin. O Instituto Smolny, em Petrogrado, converteu-se no quartel-general da revolução proletária, centro nervoso da ofensiva revolucionária, onde Lênin, Stálin, Dzerzhinsky e Sverdlov permaneciam dias e noites inteiras, sem repouso, organizando, decidindo e dirigindo o novo poder proletário.
Mais adiante, no artigo intitulado “Três Anos de Ditadura do Proletariado”, Stálin rememorou esse momento decisivo com as seguintes palavras:
No dia 24 de outubro nós, um pequeno grupo de bolcheviques dirigidos pelo camarada Lênin, contando com o apoio do Soviete de Petrogrado — já majoritariamente bolchevique —, com uma Guarda Vermelha ainda modesta e inexperiente, e com um partido comunista pequeno e em processo de consolidação derrubamos os representantes da burguesia e tomamos o poder em nossas mãos.
Volumes inteiros já foram — e muitos ainda serão — dedicados à análise do gigantesco trabalho desempenhado por Lênin e Stálin na construção do primeiro Estado socialista do mundo, tarefa que ambos conduziram com abnegação e genialidade. E, após a morte de Lênin, Stálin, na condição de dirigente do Comitê Central do Partido Bolchevique e em unidade orgânica com todo o Partido, prosseguiu inabalavelmente na obra de edificação socialista, fortalecendo, consolidando e expandindo com punho firme e visão estratégica a Terra dos Sovietes — a pátria do socialismo.
Não existia, até então, qualquer experiência histórica consolidada que pudesse servir de guia ou modelo concreto para a construção de um Estado de novo tipo, fundado sobre a base da ditadura do proletariado. A Comuna de Paris, embora grandiosa em seu heroísmo e profundamente inspiradora em sua essência política, revelou-se demasiadamente breve e episódica para exercer uma função orientadora sistemática; assim, tudo teve de ser iniciado praticamente do zero. Impunha-se, portanto, como exigência histórica imediata, a necessidade de destruir radicalmente a velha máquina estatal da burguesia — instrumento da dominação de classe capitalista — e, simultaneamente, erigir, sobre suas ruínas, um novo aparelho estatal, destinado à organização revolucionária da sociedade socialista.
Ao empunharem as armas em Outubro de 1917, os bolcheviques tinham plena consciência da magnitude histórica da missão que assumiam. A colossal tarefa de edificar um novo mundo, liberto da exploração e da opressão, não era produto de utopias voluntaristas, mas encontrava seu fundamento na ciência do marxismo, que dotava os revolucionários não apenas dos instrumentos teóricos indispensáveis à navegação nas complexas condições da nova etapa histórica, mas também de um conhecimento das leis objetivas do desenvolvimento social e de um esboço programático, ainda que embrionário, para a construção de uma sociedade socialista plenamente desenvolvida.
Ao mesmo tempo, tornou-se absolutamente necessário resistir de forma intransigente às múltiplas tentativas da burguesia contrarrevolucionária — seja através de ações militares, sabotagens ou conspirações — de restaurar o antigo poder dos capitalistas e dos latifundiários. Nesse processo grandioso de transformação do Estado e da sociedade, Stálin desempenhou um papel de envergadura histórica. Diversas instituições inéditas foram forjadas no seio do novo Estado soviético, sem precedentes na história anterior. O Comissariado do Povo para as Nacionalidades, por exemplo, representou uma criação absolutamente nova, assim como o Comissariado para a Inspeção dos Trabalhadores e Camponeses, instituído em momento posterior — ambos sob a direção direta de Stálin, que ali imprimia sua marca organizadora, centralista-democrática e profundamente revolucionária.
A ditadura do proletariado, posta em prática pela primeira vez de maneira duradoura e sistemática, constituiu uma realidade histórica inteiramente nova, à exceção da experiência embrionária da Comuna. Lênin definiu essa nova forma de poder não como uma simples substituição de um governo por outro, mas como a instauração de um Estado de novo tipo, cuja função transcendia o domínio militar, estendendo-se à reorganização econômica da sociedade, à liquidação completa das forças reacionárias herdadas do regime anterior e à criação de uma nova cultura socialista, enraizada na classe operária e nos valores do internacionalismo proletário.
Desde os primeiros dias do poder soviético, os bolcheviques depararam-se com tarefas de uma urgência e complexidade assombrosas, abarcando os mais diversos campos da vida social: administração, estruturação do novo aparato estatal, organização militar, reconstrução econômica, educação popular, agitação, propaganda, cultura etc. Nesse sentido, a teoria revolucionária tornou-se uma arma de combate. Os artigos de Stálin, publicados no Rabochy Put (Caminho do Trabalhador), serviram como guias táticos e estratégicos de altíssimo valor; do mesmo modo, os primeiros decretos do governo revolucionário delinearam os caminhos da transformação socialista.
Entre esses decretos, destacam-se a “Declaração dos Direitos dos Povos da Rússia”, publicada em 2 (15) de novembro de 1917, sob a assinatura conjunta de Lênin e Stálin, e a “Declaração dos Direitos dos Trabalhadores e Povos Explorados”, aprovada pelo 3º Congresso Pan-Russo dos Sovietes em janeiro de 1918 — ambos elaborados por Lênin em estreita colaboração com Stálin. Igualmente significativa foi a assinatura, por parte de Stálin, do decreto de confisco das fábricas Putilov e de outras grandes plantas industriais, atuando este como suplente de Lênin no Conselho dos Comissários do Povo, consolidando assim as bases econômicas do novo poder proletário.
Paralelamente, foi necessário travar uma luta implacável contra os elementos vacilantes e traidores da revolução, aqueles que fraquejaram nos momentos decisivos da insurreição de Outubro — como Zinoviev, Kamenev, Rykov e outros — que, em vez de se somarem com coragem e lealdade ao julgamento da história, preferiram recuar, prestando serviço objetivo à burguesia, aos mencheviques e aos socialistas-revolucionários. Ao lado de Lênin, Stálin combateu com firmeza esses inimigos internos da revolução.
Tratava-se, efetivamente, de uma batalha em duas frentes. Por um lado, era necessário enfrentar as forças abertamente reacionárias e contrarrevolucionárias; por outro, impunha-se o combate constante às correntes oportunistas que se diziam “de esquerda” — os chamados “comunistas de esquerda”, os trotskistas e os socialistas-revolucionários de esquerda —, cujas ações provocavam sérios danos ao Partido Bolchevique e ao próprio poder soviético.
A questão mais candente daquele momento histórico era a conclusão da paz o mais rapidamente possível. Ao assumir o poder de Estado, o Partido Bolchevique exprimia o anseio mais profundo das massas trabalhadoras — operários, camponeses, soldados e marinheiros — que exigiam com urgência o fim da guerra imperialista. A Rússia estava exaurida após quatro longos anos de carnificina. Tornava-se imperioso encerrar o conflito a qualquer custo. Lênin e Stálin, demonstrando uma compreensão aguda da realidade objetiva e uma fidelidade inquebrantável à defesa da República Soviética — baluarte da revolução mundial —, advogaram, com toda a energia, a necessidade de firmar a paz mesmo sob condições adversas, a fim de garantir uma trégua histórica que permitisse consolidar as conquistas revolucionárias.
O Governo Soviético dirigiu um apelo às nações do mundo para o encerramento da guerra com base numa paz democrática e justa. Contudo, os imperialistas da Inglaterra, França, Estados Unidos e Japão rejeitaram essa proposta, forçando a Rússia Soviética a firmar, em caráter separado, uma paz com a Alemanha. Diante das condições extremamente duras impostas pelo imperialismo alemão, os bolcheviques entenderam que, ainda assim, era preferível aceitar a paz para evitar o retorno às garras da guerra imperialista.
Os chamados “comunistas de esquerda” e os trotskistas conspiraram ativamente para sabotar essa política de paz. Seus líderes — Trotsky, Bukhárin, Pyatakov, Radek — chegaram ao ponto de articular planos para a derrubada do poder soviético, a substituição do governo revolucionário por um novo gabinete liderado por Trotsky e o assassinato de Lênin, Stálin e outros dirigentes fiéis ao marxismo-leninismo. Kamenev, Zinoviev, Trotsky e os “comunistas de esquerda” engendraram uma virulenta campanha contra Lênin, Stálin, Sverdlov e os principais defensores da paz, chegando ao cúmulo de aceitar a destruição do regime soviético como preço de sua demagogia pseudo-revolucionária.
Jamais, ao que parece, — escreve Stálin em seu texto “Sobre a Oposição”, — a luta interna no Partido atingira tamanha ferocidade quanto naquele período da Paz de Brest-Litovsk.
E, de fato, durante a reunião do Comitê Central do Partido Bolchevique, realizada em 23 de fevereiro de 1918, Stálin uniu-se a Lênin na resistência decidida aos ataques políticos dos trotskistas e dos autodenominados “comunistas de esquerda”. Com clareza lapidar, Stálin proclamou: “Ou uma pausa, ou a derrocada da revolução.” E prosseguiu, elucidando o conteúdo estratégico da questão: “A questão se resume ao seguinte — ou nossa revolução é derrotada e a revolução na Europa é acorrentada, ou asseguramos uma pausa e consolidamos nossa posição”.
Foi unicamente graças à firmeza política, à determinação revolucionária e à coerência teórica de Lênin, Stálin, Sverdlov e dos bolcheviques verdadeiramente leais à linha do Partido que os “comunistas de esquerda” foram derrotados. A maioria do Comitê Central, assim como o Partido em seu conjunto, compreendeu o alcance histórico do dilema colocado e posicionou-se com lucidez ao lado de Lênin e Stálin, mesmo diante dos draconianos termos impostos pelo tratado de paz. No dia seguinte à assinatura da Paz de Brest-Litovsk, Lênin publicou um artigo emblemático, intitulado “Uma Paz Dolorosa”, no qual afirmou com a força de quem entende o compasso da história:
A história avança agora com uma velocidade ainda mais vertiginosa; os acontecimentos precipitam-se em torrente, e as tragédias que se abatem sobre povos inteiros — esmagados ou em vias de serem esmagados pelo monstruoso mecanismo da guerra imperialista — assumem proporções cada vez mais devastadoras e inomináveis. Assistimos à crescente interpenetração entre as tendências e movimentos do imperialismo — com sua fome insaciável de dominação e pilhagem — e as aspirações dos povos à libertação nacional, com a trágica diferença de que, enquanto os primeiros se mostram incomensuravelmente fortalecidos, os segundos, no estágio atual, aparecem gravemente debilitados, dispersos e comprimidos pelas engrenagens do capital mundial.
Entretanto, apesar de toda a brutalidade da reação imperialista e da correlação desfavorável de forças neste momento histórico, a história não estagna. Ela segue seu curso — silenciosa, mas implacavelmente —, e no interior dos países capitalistas mais avançados, nas entranhas das metrópoles que hoje se imaginam invencíveis, vai amadurecendo, lenta, mas inevitavelmente, a revolução socialista. Uma revolução incomparavelmente mais profunda, mais radical, mais orgânica, mais enraizada nas massas exploradas e oprimidas, e infinitamente mais poderosa que as revoluções burguesas do passado, cujo ciclo histórico já se encontra esgotado.
Disto decorre uma lição fundamental — repetida inúmeras vezes pelos mestres do socialismo científico — e que se reafirma com ainda mais vigor nestes tempos de provação: entre todos os sentimentos que a conjuntura pode inspirar, o mais inadmissível, o mais corrosivo, o mais politicamente nefasto, é o desespero. Os termos da paz — essa paz armada, imposta pelo punho imperialista — são, sim, intoleravelmente duros, humilhantes, brutais. Mas a história, que opera segundo leis próprias, exigirá o que lhe pertence por direito e necessidade. Ela virá — mesmo que não na velocidade que nossa vontade revolucionária almeja — em nosso auxílio, na forma concreta e inadiável da revolução socialista mundial, que se forja nos subterrâneos da sociedade capitalista internacional.
Estamos cercados pelo saqueador, esmagados por suas botas, humilhados por sua arrogância e sua violência — mas somos capazes de suportar esses fardos históricos, porque não estamos sós. Temos aliados, companheiros de armas, irmãos de classe espalhados pelos continentes; milhões de trabalhadores e povos oprimidos, que embora hoje estejam retardados por circunstâncias alheias à sua vontade, encontrarão seu caminho e virão, inexoravelmente, ao nosso encontro.
Nosso dever, portanto, é claro e inadiável: organizar, organizar e ainda mais organizar! O futuro, por mais duras que sejam as provações do presente, pertence a nós.
Nesse contexto, o trabalho desempenhado pelo Governo Soviético revelou-se de importância decisiva, especialmente no que concerne à resolução das complexas questões nacionais, à organização das novas repúblicas soviéticas e à formulação de uma política nacional, orientada pelo marxismo-leninismo e compreensível tanto ao Partido quanto às massas populares e à comunidade internacional.
Stálin foi, ao longo de todo esse processo, o principal dirigente bolchevique responsável pela questão nacional. Em todos os congressos, conferências e assembleias partidárias, coube-lhe a tarefa de relatar a linha do Partido nesse tema fundamental. Foi ele também o autor das resoluções centrais sobre a questão nacional, sendo de sua lavra a redação da primeira Constituição da República Socialista Federativa Soviética da Rússia (RSFSR), marco jurídico da ditadura proletária multinacional.
Em 27 de abril de 1918, por proposta de Lênin, Stálin foi nomeado plenipotenciário da RSFSR para as negociações com a Rada Ucraniana. Esta era um governo burguês que havia tomado o poder no país com o auxílio de forças estrangeiras de intervenção, dos mencheviques e dos socialistas-revolucionários. Quando eclodiu o conflito entre a Rada e o Governo Soviético, Stálin foi enviado à Ucrânia; lá, ele pôde verificar o verdadeiro caráter político da Rada, que atuava como corretora e lacaia dos interesses da burguesia — representando, portanto, uma tentativa de divisão do poder entre a burguesia, de um lado, e o proletariado e o campesinato, de outro. O Partido Bolchevique, que jamais compartilhou o poder com a burguesia, derrubou a Rada.
Stálin, nesse processo, atuou com brilhantismo político e firmeza organizativa, cumprindo integralmente os desígnios do Partido e dirigindo as massas ucranianas na luta contra o domínio burguês. Simultaneamente, desempenhou papel de destaque no processo de sovietização da Bielorrússia.
Foi também ele quem organizou e presidiu o Congresso Constituinte da República Tátaro-Bachkir. No discurso proferido nesse evento — publicado no Pravda em 10 de maio de 1918 — Stálin encerrou sua intervenção com um apelo vibrante aos povos muçulmanos da região, dirigindo-se aos bachkires, aos tártaros e, de forma mais ampla, a todos os povos islâmicos do Oriente:
Entre todas as formas de opressão que hoje assolam a humanidade, nenhuma se revela tão insidiosa e tão perigosamente eficaz quanto a opressão nacional. Seu caráter insidioso reside no fato de que ela serve como um disfarce conveniente para encobrir o verdadeiro rosto da burguesia — predador, espoliador, explorador. Sua periculosidade, por sua vez, manifesta-se na capacidade de desviar a indignação das massas e de canalizar a tempestade social provocada pelas contradições do capitalismo para falsos alvos: a divisão entre nações, o ódio entre povos, a rivalidade entre trabalhadores de diferentes origens.
Se os abutres do imperialismo europeu conseguiram — e ainda conseguem — lançar os operários uns contra os outros nas carnificinas das guerras mundiais, se são capazes de manter acesa essa fogueira sangrenta, isso se deve, em larga medida, à persistente força do nacionalismo burguês, que ainda obscurece a consciência de classe dos trabalhadores, impedindo-os de reconhecer o inimigo comum e de agir unificados enquanto classe revolucionária. O nacionalismo representa, nesse sentido, a última trincheira ideológica da burguesia; uma posição moral e política que deve ser tomada e destruída se quisermos levá-la à derrota definitiva.
No entanto, há quem, em nome de uma falsa radicalidade, se recuse a reconhecer a gravidade da questão nacional, preferindo ignorá-la ou negá-la, como se esse niilismo nacional, por si só, fosse suficiente para dissolver o veneno do chauvinismo. Nada poderia ser mais equivocado e politicamente contraproducente. Ao negligenciar a questão nacional, esses camaradas incorrem no erro fatal de fazer o jogo do inimigo, pois deixam intacta a arma ideológica mais resistente da burguesia — seu apelo à identidade nacional.
Derrotar o nacionalismo burguês exige, antes de tudo, enfrentá-lo abertamente, colocar a questão nacional no centro do programa revolucionário e resolvê-la com base em princípios proletários e socialistas. Mas para isso, é imperativo conduzir essa resolução pelo caminho soviético, ou seja, submeter toda e qualquer formulação da questão nacional aos interesses superiores das massas trabalhadoras, organizadas politicamente sob a forma de sovietes. Só por esse caminho, e por nenhum outro, será possível arrancar das mãos da burguesia sua última arma moral.
A criação da República Autônoma dos Tártaros-Bachkírios constitui, neste sentido, a expressão prática, concreta e histórica da resolução socialista da questão nacional. Possa esta república brilhar, a partir de hoje, como um farol luminoso para os povos muçulmanos do Oriente, um farol que ilumina o caminho da libertação das cadeias do colonialismo e da escravidão nacional.
Igualmente decisiva foi sua intervenção nos processos revolucionários do Cáucaso. Stálin teve papel ativo na libertação dos povos da Transcaucásia, livrando-os do jugo reacionário imposto pelos mencheviques, pelos nacionalistas armênios (dashnaks) e pelos mussavatistas — sendo estes últimos membros do Partido Democrático Mussavat, fundado em 1912 no Azerbaijão, defensores do capitalismo e da unificação dos povos turcos sob o Império Otomano, apoiadores do czarismo durante a guerra imperialista, inimigos dos bolcheviques em Baku em 1918 e colaboradores de Denikin em 1920.
Durante esse período de vitórias sucessivas da Revolução de Outubro — definido por Lênin como a “marcha triunfal do poder soviético” — impunha-se, como nova frente de luta, a tarefa de estabelecer os fundamentos econômicos da sociedade socialista. A maior dificuldade, nesse contexto, era a questão da fome. Quando os bolcheviques tomaram o poder, Petrogrado contava com provisões suficientes para apenas dois dias. Apenas graças aos esforços tenazes de Stálin, que conduziu pessoalmente a busca por alimentos nos armazéns e depósitos, foi possível garantir um suprimento de pão para os dez dias seguintes. E não se tratava de reservas destinadas à especulação dos magnatas como Ryabushinsky e sua camarilha — os quais, cegos de ódio, preferiam assistir à revolução perecer sob os grilhões da fome do que ver ruir seu domínio de classe.
E assim, encontramos Stálin incumbido de uma das tarefas mais cruciais da conjuntura revolucionária: a organização do abastecimento alimentar, que, sob as condições do cerco interno e externo à jovem República Soviética, transformava-se numa verdadeira frente de batalha. Um decreto do Conselho dos Comissários do Povo, datado de 29 de maio de 1918 e assinado por Lênin, formalizava essa designação estratégica nos seguintes termos:
O Comissário do Povo Josef Vissarionovitch Stálin, membro do Conselho dos Comissários do Povo, é nomeado Diretor-Geral do Abastecimento Alimentar nas regiões do sul da Rússia.
Tratava-se, em essência, de uma autêntica guerra pelo pão. As regiões mais férteis e produtivas do país haviam sido cortadas do corpo da Rússia Soviética pelas forças da Guarda Branca e pelos exércitos de intervenção estrangeira. Desde os primeiros momentos à frente da tarefa, Stálin compreendeu com clareza cristalina que a obtenção de grãos para sustentar as cidades e o Exército Vermelho não poderia ser garantida por métodos administrativos convencionais, mas exigiria, necessariamente, o emprego da força armada contra os kulaks e os sabotadores da retaguarda.
Em uma conversa com Lênin, às vésperas de sua partida para o sul, no dia 23 de maio de 1918, Stálin relatou a gravidade logística da situação:
Há grandes estoques de grãos no Norte do Cáucaso, mas não podem ser enviados neste momento, pois a linha férrea foi cortada. Até que esta linha seja restaurada, o transporte de grãos está fora de questão.
Dias depois, já em campo, Stálin informava por carta a Lênin:
Você receberá 160 vagões de grãos e 46 vagões de peixe nas próximas semanas. O restante será enviado por meio de Saratov.
Era sob tais condições que o esforço titânico de organização do abastecimento alimentar precisava ser empreendido. A região do Don e a cidade de Tsaritsyn — ponto estratégico de encruzilhada ferroviária e acesso ao coração do país — estavam sob ameaça direta da contraofensiva branca. Revoltas fomentadas pelos kulaks multiplicavam-se por todo o interior, aliando-se, objetiva e subjetivamente, ao bloqueio alimentício como arma para estrangular a Revolução. A essa situação explosiva somava-se a traição aberta do chamado Partido dos Kulaks — os “socialistas-revolucionários de esquerda” — cuja insurreição em Moscou, no início de julho de 1918, agravou ainda mais a conjuntura.
Respondendo a uma missiva de Lênin, na qual este alertava para a possível atuação dos socialistas-revolucionários de esquerda em Tsaritsyn, Stálin respondeu com a firmeza que o caracterizava:
Quanto aos gritos histéricos, esteja certo, nossa mão não tremerá. Trataremos inimigos como inimigos devem ser tratados.
Era, sem dúvida, difícil encontrar entre os quadros do Partido um camarada mais capacitado, mais decidido e mais eficaz para cumprir tamanha responsabilidade. Lênin reconhecia isso com nitidez e atribuiu importância decisiva à presença de Stálin em Tsaritsyn. Em uma proclamação pública do Conselho dos Comissários do Povo, dirigida “A Todos os Trabalhadores”, lia-se:
A tomada de pontos estratégicos da ferrovia siberiana pelos contrarrevolucionários afetará, sem dúvida, o abastecimento da população faminta por algum tempo. Mas os imperialistas russos, franceses, britânicos e tchecoslovacos não conseguirão submeter à fome o Norte. O Sudeste já se ergue em socorro do Norte faminto.
De Tsaritsyn, Stálin coordenava não apenas a distribuição e o envio de cereais, peixe e outros gêneros alimentícios oriundos do Don e do Kuban, como também a defesa da retaguarda soviética contra a sabotagem. Foi ali, naquela posição estratégica, que Stálin discerniu com clareza o caráter nocivo e profundamente destrutivo da política militar promovida por Trotsky no Exército Vermelho. Em correspondência direta com Lênin, denunciou as consequências desastrosas daquela linha, que favorecia objetivamente os interesses dos Guardas Brancos e das potências estrangeiras hostis ao regime soviético. Assim, Stálin exigiu que Trotsky fosse destituído de sua posição à frente das tropas no front sul. Lênin, conhecedor profundo da firmeza, da lealdade e da capacidade organizativa de Stálin, confiou-lhe a tarefa de:
Restabelecer a ordem, consolidar os destacamentos em unidades regulares e estabelecer um comando superior após eliminar toda insubordinação.
Stálin assumiu a direção do Conselho Militar Revolucionário da Frente Sul e, em tempo extremamente curto, conseguiu reconstruir as forças armadas locais. Organizou novas divisões, brigadas e regimentos; reestruturou o abastecimento militar e promoveu a reorganização política do exército e da retaguarda, expulsando sem hesitação os elementos contrarrevolucionários, os sabotadores e os oportunistas infiltrados. Essa grandiosa tarefa foi realizada com o apoio de camaradas profundamente leais e combativos, como Voroshilov, Kirov, Ordzhonikidze, Budyonny, Shchadenko e Mekhlis.
Quando Trotsky tentou sabotar o curso correto da frente sul emitindo ordens por escrito em contradição com as medidas adotadas por Stálin, este — com total legitimidade — anotou à margem: “Ignorar”.
Foi exclusivamente graças à firme e acertada linha bolchevique encarnada por Stálin que o front de Tsaritsyn foi estabilizado, os exércitos da Guarda Branca foram esmagados, e o inimigo foi repelido além do Don. A Revolução respirava, vencia e avançava — e Stálin, naquele momento crítico, surgia como uma das colunas indispensáveis da construção e defesa do poder soviético.
Entretanto, mesmo empunhando as armas em defesa intransigente da República Soviética, Stálin jamais descuidou de outra frente essencial da luta revolucionária: a teoria. Compreendia que, assim como o fuzil é indispensável à vitória militar, o pensamento científico, forjado na teoria do marxismo-leninismo, é igualmente indispensável à orientação estratégica e política do proletariado. Por isso, nunca interrompeu sua atividade literária. Mesmo nos dias mais árduos da guerra civil, continuou escrevendo de forma sistemática, intervindo diretamente nos grandes debates da revolução.
Os artigos que publicou no Pravda durante esse período abordaram com profundidade as questões mais candentes da construção do novo poder, sempre do ponto de vista do marxismo, seguindo o método autenticamente bolchevique, enraizada nos interesses históricos da classe trabalhadora.
Entre essas intervenções teóricas, destaca-se, pela sua importância programática e alcance estratégico, o artigo “A Revolução de Outubro e a Questão Nacional”, publicado em duas partes nos dias 6 e 19 de novembro de 1918, posteriormente incorporado à coletânea “Marxismo e a Questão Nacional e Colonial”. Nesse texto, Stálin articula com clareza dialética a conexão entre a vitória do proletariado na Rússia e o despertar revolucionário dos povos oprimidos das colônias e semicolônias, traçando as linhas gerais de uma política proletária internacionalista para a revolução mundial.
Paralelamente, continuou publicando textos em jornais e boletins locais da cidade de Tsaritsyn, abordando questões militares, organizativas e políticas da Frente Sul, contribuindo tanto para a formação ideológica dos quadros quanto para a mobilização das massas sob o fogo da luta de classes.
Assim, ao examinarmos com atenção esse primeiro período da República Soviética, constatamos com clareza a amplitude e profundidade da atuação de Stálin, que revelou, já naquele momento inicial, uma aptidão extraordinária para os mais diversos domínios da construção socialista: organização partidária e estatal, administração pública, economia de guerra, direção militar e elaboração teórica. A confiança do Partido em sua figura se enraizava cada vez mais profundamente, pois todos os que ombreavam com ele podiam constatar que sua dedicação era absoluta, que nenhuma de suas energias era poupada e que toda sua capacidade intelectual estava colocada a serviço da consolidação e do avanço da revolução socialista.
Sua autoridade não era imposta, mas conquistada. Conquistada pela coerência de sua prática, pela seriedade de sua palavra e pela inflexível disciplina que aplicava, em primeiro lugar, a si mesmo. Stálin conquistava autoridade, sobretudo, por meio de sua atividade incansável e de sua devoção ilimitada à causa da classe operária.
A revolução é a mais grandiosa e implacável das escolas — e Stálin, ainda que na condição de guia e dirigente, jamais deixou de aprender com ela. Sabia escutar o pulso da história, sabia absorver as lições que emergiam da luta das massas, da experiência viva dos operários e camponeses. Sua relação com o povo era profundamente dialética: enquanto os guiava, também se formava, também aprendia, tornando-se, ele próprio, produto consciente da revolução socialista.